Friday, June 15, 2012

Venha o diabo e escolha

Eu devia ser estudado.
E acreditem que não digo isto com orgulho...
Eu devia estar preso num laboratório, 24 horas por dia, com indivíduos a analisarem-me as ondas cerebrais, a estudarem as minhas reacções a estímulos variados e com tailandesas a darem-me massagens com óleos e bálsamos. Ok, a parte das tailandesas era só para minha autorecriação. Mas ainda assim, o estudo aprofundado da minha psique seria um bem maior para a sociedade.

A questão essencial, essa, é permanente: "Porque é que eu continuo a fazer mal a mim próprio?"
Esta minha tendência para a autodestruição começa a preocupar-me. E atenção que não falo de interesse no suicídio ou de visionamento contínuo de filmes do Manoel de Oliveira... Falo das trapalhadas constantes que começam, a pouco e pouco, a dar cabo de mim.

Hoje acordei às 7 da manhã para ir ao ginásio.
Sim, eu sei que há coisas mais impressionantes do que essa, mas ainda assim custa-me acordar tão cedo pela simples razão de que me deito sempre tarde. Eu sei que me podia deitar também cedo mas um indivíduo como eu, que tem responsabilidades para com o país e o mundo, ao nível da cultura e da alta finança, não se pode dar ao luxo de descansar muito. Isso e porque costumo ficar a pastelar no computador até doerem os olhos. O problema é que a minha mulher também quer ir ao ginásio dela (hoje em dia deixam-nas fazer tudo) e prefere fazê-lo antes do trabalho. E como costumamos ir juntos para Lisboa não me restam grandes alternativas do que ir com ela e fazer com que os nossos horários coincidam. No entanto, atenção: prego-lhe sempre duas ou três lambadas a meio da A5... Só para marcar a minha posição e para que não me confundam com um choninhas que constrói as rotinas com base nas da cara metade.

Bom, hoje foi o meu primeiro dia no ginásio novo.
Não que não gostasse do meu ginásio antigo, como provam aliás este e este post, mas o facto de ter vindo trabalhar para Lisboa fez com que o outro local ficasse um bocado fora de mão. Desejo o melhor para o puto dos seios copa D, assim como a todos os outros idiotas de merda, mas a vida obriga-me a seguir em frente.

O ginásio novo...
A caminho de Lisboa no lugar do passageiro, ainda meio a dormir, engoli um iogurte e uma banana para me ajudar a suportar o exercício matinal. Isto enquanto segurava também no GPS (que a patroa não sabia ir dar ao meu ginásio), o MP3, o papelinho com o código para entrar no raio do sítio, a mala, os óculos de sol e a carteira. Portanto, antes das 8h já eu realizava um bonito espectáculo de malabarismo em plena avenida marginal, arriscando-me a mastigar o MP3 ou a digitar a morada na casca da banana. Portanto, um imbróglio do catano.

Chegados à capital, deixam-me à porta do tal sítio e fico logo muito impressionado.
É um conceito novo de ginásios low cost mas com muito bom ar, em que o preço baixo vem precisamente do facto de terem o mínimo de pessoas a trabalhar lá... Um pouco como aqueles motéis que se pagam com o cartão no parque de estacionamento e só se sabe que lá estivemos quando a esposa ou esposo descobrem o talão do multibanco. Pelo menos uma ou duas pessoas que lêem este post sabem do que estou a falar.

Bem, mas cheguei à porta de entrada, carregado com o saco do ginásio, a marmita do almoço, a mala, o MP3, os óculos de sol, a carteira e o papelinho (o GPS e o lixo do pequeno almoço ficaram no carro), portanto com o look "sem abrigo" totalmente a funcionar, cheguei à entrada e deparei-me com o quadro onde deveria digitar o tal código. Desdobrei o papelinho p'ra topar o número e digitei-o uma vez. Não abriu. Outra vez. Voltou a não abrir. Isto enquanto indivíduos passavam para dentro e para fora do local, olhando-me de lado e fazendo caretas ao meu aspecto de vendedor ambulante. Outra vez. Não abriu. Quando começava a ficar desesperado e a ligar à minha mulher (não que ela me pudesse ajudar mas era só para poder reclamar com alguém) apareceu um segurança que me perguntou o que se passava, posso jurar, com uma mão já na lata de gás pimenta não fosse o diabo tecê-las.

Expliquei-lhe que estava há demasiado tempo a colocar o meu código de seis dígitos no painel e que não conseguia abrir a porta.

Ele ficou a olhar para mim sem dizer nada.

Eu olhei uma vez mais para o papelinho.

Percebi que estava a digitar o código errado...

"6 NÚMEROS E ESTA BESTA NÃO CONSEGUE ACERTAR COM TODOS!!!", pensei eu.

Mas não dei parte fraca.

Sem alterar a expressão facial, voltei a digitar o código e desta vez a porta abriu.
Ensaiei um "ATÉ QUE ENFIM!", irritado, e olhei para o segurança abanando a cabeça como quem diz "Estas máquinas podem ser muito modernas mas só trabalham quando lhes apetece..."

O segurança não mudou a sua expressão facial.

Depois, deu-me as boas-vindas tratando-me pelo nome, porque quando se digita o código aparece o nome num ecrã qualquer que não vi onde estava, e começou a mostrar-me as instalações do ginásio, apercebendo-se de que era a minha primeira vez. Sala após sala percebi onde estava tudo, como tudo funcionava e estava pronto para começar a treinar. Pronto e entusiasmado, diga-se.

Assim, eu e a minha panóplia de tralha dirigimo-nos aos balneários e comecei a tirar as coisas do saco e a colocá-las no cacifo. Marmita, mala, carteira, óculos de sol e papelinho directamente lá para trás, começar a despir, começar a tirar as coisas do saco...

Ora, ténis... check!

Toalha... check!

Chinelas e roupa interior... check!

Completa e total ausência de calções e t-shirt para treinar... check!

...

O QUÊ?!

...

Tinha-me esquecido da merda dos calções e da t-shirt...

...

COMO ERA POSSÍVEL?!

COMO É QUE EU TINHA CONSEGUIDO SER TÃO ESTÚPIDO?!



MAIS IMPORTANTE DO QUE ISSO: PORQUÊ?!!!!!

...

...

Agora, lá estava eu, meio despido, a olhar fixamente para um saco do ginásio meio vazio e a suar abundantemente da testa.

O cacifo já cheio com as minhas traquitanas.

E eu a avaliar esta merda toda sem saber o que fazer.

O ginásio completo de malta que de certeza que estava a topar perfeitamente a situação e a gozar o prato.
Eu bem os ouvi a rir...

O segurança lá fora, convencido de que eu iria treinar pela primeira vez.

Desespero...

Olhei para o que tinha e passou-me pela cabeça ir treinar enfaixado na toalha como um faquir.

Mas cedo concluí que a retirada era a solução mais sensata e menos dada a atrair ainda mais estupidez. Fingi receber uma chamada importante de trabalho e, arrumando as coisas mais depressa do que a Selecção Portuguesa no Euro, dirigi-me para a saída de telefone na mão e sorriso nervoso no focinho. Passei pelo segurança que estava a falar com uma pessoa qualquer e não tive a oportunidade de lhe dar qualquer explicação. Apenas lancei um grunhido surdo e dei corda aos sapatos dali p'ra fora.
 
Não sem ter deixado com certeza meia dúzia de pessoas a pensar que:

A) sou um terrorista que, às claras, deixou lá meia dúzia de bombas e saiu a correr

B) sou um fervoroso homossexual que paga as quotas no ginásio só para ver os homens nus no balneário

C) sou um palerma que não sabe preparar o saco de treino


Sinceramente, venha o diabo e escolha...

Monday, June 11, 2012

A única verdade

Fui ontem ver o Prometheus, o filme que tem feito brotar toda uma panóplia de emoções entre o público cinéfilo. As emoções são muitas mas, a avaliar pelo que se tem escrito na net, poucas delas são positivas: temos desde a indignação ao ódio, desde a raiva ao agastamento e, às vezes, até um piscarzinho de olhos ao desprezo. 'Tá tudo com vontade de dizer das boas ao Ridley Scott ou até, para compor o discurso, de lhe mandar uma chapada na tromba. Eu, que nunca engracei com o senhor Scott, excepto nos incontornáveis Alien e Blade Runner, claro está, também estou consternado. Mas mais por solidariedade à malta do que por outra coisa qualquer. É que o senhor Scott é só um e a turba consternada é, como o próprio nome indica, uma turba! Como tal, eu na dúvida estou sempre do lado daqueles que me podem aleijar menos em caso de descontrolo.

Se eu gostei do filme? Por acaso até gostei bastante.
Se o Ridley Scott já me fez algum mal? Por acaso até fez. Nomeadamente nas vezes que gastei do dinheiro que me custa a ganhar para ver as inúmeras banhadas do menino. Mas pronto, todos os males do mundo fossem esses...

Desta vez, o desgraçado prejudicou-me consideravelmente menos do que à maioria das pessoas, admito. Mas ainda assim conseguiu deixar-me preocupado com a porra do filme. Preocupado, leram bem.

A preocupação é muito simples: depois de visionar uma película em que uma equipa de cerca de dez pessoas parte em busca do segredo da Humanidade e dá de caras com um rico e completo bouquet de mostrengos extraterrestres, de tempestades de sílica e de naves gigantescas daquelas que esmagam (sim, até parece que nunca viram nenhuma...), cheguei à conclusão de que basicamente não estou preparado PARA NADA.

Aquela malta corre, salta, anda ao soco, rebola, corre outra vez... e tudo isto dentro de uma espécie de fato de astronauta ou lá o que é! Há uma tipa que chega ao ponto de se meter dentro de uma cabine p'ra tirar uma lula do bucho à base de pinça e tudo (uma pinça daquelas que há nas máquinas dos snack-bares e que comigo nem uma merda de um peluche conseguem sacar), e a mulher consegue esta proeza sem perder a estaleca para correr, saltar e andar ao soco. Portanto isto é malta que sabe. E eu, definitivamente, não sei.

'Tá bem que aquilo é filme. Nem me passa pela cabeça achar que há ali alguma coisa de verdadeiro.
Mas a verdade é que quando vierem p'raí os aliens a abrir caminho "à patrão", determinados a desfazer a Terra com os seus ácidos (que eles andam com ela fisgada já há muito) ninguém vai poder contar comigo para salvar o que quer que seja. Não há dúvida, que o meu perfil é mais o de ser salvo. É para isso que tenho jeito. Mas enquanto houverem damas no mundo, herói nenhum vai desviar-se do seu caminho para safar um indivíduo gordo, careca e barbudo que acaba por constituir um perigo para o próprio salvamento. Para mim é claro como água que seria dos primeiros a patinar...

Eu até tenho andado no ginásio e assim, mas há arestas que não se limam da noite para o dia. E isso prova-se com uma análise mais detalhada...



AS 5 RAZÕES PELAS QUAIS NINGUÉM VAI PODER CONTAR COMIGO CASO ISTO DÊ TUDO P'RÓ TORTO AO NÍVEL DE BICHEZA EXTRATERRESTRE!


1) O fato de astronauta

Nem é por ter excesso de peso nem nada. É difícil encontrar calças que me sirvam por causa das minhas proporções, digamos, fora do comum. Há uma ou outra na C&A mas, por exemplo, na Pull&Bear é bem mais complicado. Ora, em plena invasão alien, e caso seja necessário arranjar fatos espaciais, duvido bastante que a C&A seja consultada para o efeito. E como também duvido que venham tirar medidas a este menino para mandarem fazer a vestimenta num alfaiate julgo que estou definitivamente fora da corrida (até porque a alta costura espacial é uma bonita tradição em desuso porque infelizmente "a malta nova não quer pegar nisto").


2) O ofício

Sou licenciado em design de comunicação mas muito do que faço profissionalmente envolve a escrita. No entanto, e como é sabido, nestas cobóiadas com monstruosidades de outros planetas são os atletas, os militares, os biólogos, os matemáticos e os cientistas em geral que se orientam melhor e que oferecem mais utilidade. Em caso de aperto, não é com certeza um argumento de banda desenhada ou um conto literário que nos vai salvar. Se os aliens apreciarem ouvir contar histórias sempre posso juntá-los em círculo e ler uma das minhas enquanto um qualquer soldado lhes espeta mísseis pelos tentáculos adentro. No entanto, acho essa hipótese muito pouco plausível.


3) Correr


Lá está, tenho exercido actividade física num ginásio mas não sou um corredor de fundo. Em caso de ataque, um tipo tem é de se por "nas meninas" mais rápido do que leva a dizer "CATANO! CUIDADO COM OS DENTINHOS DO MOLUSCO!". Eu sou mais de ir correr para o passadiço que liga o Estoril e Cascais e parar para descansar quando me apetece. Duvido que os monstros respeitassem o meu ritmo de corrida porque boa educação é coisa que não impera em criaturas peçonhentas com manias de dominar o universo. É pena porque acredito que tudo sabe melhor quando feito com cordialidade mas enfim...


4) O asco


Não me interpretem mal, não sou nenhuma florzinha de estufa. Mas digamos que há coisas em casa, e a minha mulher sabe do que falo, que me são particularmente difíceis de fazer. Lavar o caixote do lixo ou limpar a casa de banho dos gatos são duas delas. Tenho nojo. Agora imaginem como reagiria se tivesse um polvo humanóide aos saltos em cima de mim, cheio de baba e ranho, a querer envolvimento físico à base de porrada. Ora, eu nem caracóis como. Seria muito difícil comportar-me como um verdadeiro homem perante tão viscoso cenário...


5) A chamada bulha


E por falar em porrada chegámos ao último ponto da lista. É certo que poderiam haver muitos mais mas não vos quero maçar. Eu não tenho nada contra andar à bulha, pratiquei karate durante muitos anos e havia quem dissesse que era bastante bom. Não há em Trajouce quem se tenha esquecido das minhas performances em estágios. E quem diz Trajouce diz parte da Abóbada. O karate era uma actividade desportiva que eu gostava mas não propriamente por causa da violência. Tanto quanto possível acho que é sempre melhor trocar os tiros e as explosões por um debate aceso moderado por um jornalista credível. O Júlio Magalhães por exemplo. O que se perdia em espectáculo de fogo de artifício ganhava-se em audiências, o que para mim é sempre preferível...



Portanto, e mesmo sem que eu tenha desgostado da coisa, o senhor Scott arranjou mais uma vez maneira de me lixar. Nem por um segundo estas questões abandonaram a minha mente enquanto visionava o filme que era, como todos agora, em 3D. Enquanto devia estar a seguir a narrativa e a conhecer os personagens estava a analisar em qual daqueles rochedos é que eu me escondia se ali estivesse... O que não é cobardia, prefiro chamar-lhe de planeamento estratégico.

Se vierem aí os aliens sou tão inútil como o palhaço Tiririca numa board meeting da Goldmann Sachs. A verdade é esta.

E até ver é mesmo a única verdade.