Sunday, November 21, 2010

Darwin para Totós

Quem já leu Darwin, quem percebe alguma coisa de Evolução ou lê outra coisa que não seja a Tv Guia sabe que só existem 2 tipos de seres humanos: os Caçadores e os Recolectores.

Ora, eu nunca li Darwin nem percebo mais de Evolução do que o comum dos mortais mas achei que dava mais credibilidade à minha tese se começasse o texto desta forma.
Chamem-lhe má fé, chamem-lhe estupidez, mas de qualquer maneira está na altura de pormos as Tv Guias de lado e reflectirmos um pouco sobre esta ideia.

Caçadores e Recolectores.

Há quem diga que foi assim, no Passado. Tipo, há milhares de anos.
Eu não sou capaz de comprovar porque não era nascido. Mas o Manuel de Oliveira era e foi mais ou menos nessa altura que idealizou o "Aniki Bóbó". Só que a malta na altura era burra e não ia ao cinema.

Bom, falo em caça e em recolecção para definir a relação que as pessoas têm com os seus pertences. Os Caçadores são aqueles que quando querem alguma coisa, falemos apenas de bens essenciais à vida como uma casa para viver ou a última versão do PES para a Playstation 3, lutam, trabalham, suam e sangram para a conseguir. Porém, quando finalmente atingem o seu objectivo, desfrutam do seu pertence e quando acabam pouco se importam com o que lhe acontece. Se se perder, perdeu. Se se estragar, estragou. Se, digamos, uma gata ou uma coelha roer, roeu. E está-se assim muito bem.
Os Recolectores já são diferentes. Para conseguirem cumprir o seus desejos muitas vezes aplicam o mesmo esforço do que os Caçadores mas quando têm nas suas mãos o tão anciado prémio... Guardam-no. Protegem-no. Nunca se livram dele. E, muitas vezes. coleccionam-no.

Eu sou um Recolector.

Já fui mais, há que dizê-lo. Mas é algo que me está na massa do sangue.
A minha tendência é para agrupar objectos semelhantes, assim como fazem certos chimpanzés em laboratórios de pesquisa. Só que a mim deixaram de me dar bananas como recompensa há alguns anos. Ainda assim, achei que estava na altura de homenagear a nobre arte do coleccionismo e escrever sobre as minhas colecções de sempre.

Já não começo nenhuma colecção há muitos anos. Há quem diga que amadureci mas eu acho que é por falta de tempo. Tenho acumulado gordura na pança mas isso dificilmente será uma colecção... Quando muito é um passatempo. Mas uma colecção implica outro tipo de directrizes. Anyway, como não podia deixar de ser, e porque este blogue vive muito de rankings, aqui ficam os Tops das minhas colecções. Dividi a contagem em dois, as normais e as anormais... Porquê? Vocês vão perceber porquê.


TOP 3 DAS COLECÇÕES, DIGAMOS NORMAIS, SE É QUE ALGUMA COLECÇÃO CONSEGUE SÊ-LO, MAS PRONTO ESTAS SERÃO MAIS SOCIALMENTE ACEITES DO QUE AS OUTRAS VÁ, DO VOSSO SEMPRE AMIGO SAGUIM.


1.
SELOS

Até aqui tudo normal, parece-me.

As colecções de selos existem há séculos, muita gente como deve ser as fez e convenhamos que não deixa de ser um investimento. É que isto é coisa para valer algum dinheiro. Não organizada como eu a tenho claro... Desta maneira calculo que não sirva p'ra nada. Tenho vários álbuns, cada um relativo a um continente, onde os selos estão divididos por países e pouco mais do que isso. Estou-me nas tintas para as séries, para os anos e para o raio que parta... aquilo está orientado por temazinhos e já é uma grande coisa!

No início organizava os selos com a ajuda de uma pinça.
Mas era só para fazer vista. Para dar estilo.
Todavia, como invariavelmente esta actividade deprimente decorria na solidão do meu lar, apercebi-me que não estava a impressionar ninguém. E então reformei a pinça.

Lembro-me que o pontapé de saída para ter decidido fazer uma colecção de selos foi ter sabido que o meu avô em tempos também tinha tido uma. Só que teve de vendê-la devido a problemas financeiros. Isto porque a dele, sim, valia alguma coisa. Lembro-me que depois de me ter contado isto lhe perguntei porque não tinha tirado umas fotos dos álbuns para guardar como recordação. Ele olhou para o puto estúpido que lhe tinha feito a pergunta estúpida e limitou-se a encolher os ombros, evitando olhar para a minha cara sorridente que achava ter focado um ponto importante. Enfim...


2.
ÍMANES PARA FRIGORÍFICO / COPINHOS DE SHOT

Dois enormérrimos clichés. E, para mim, dois gigantescos potes de areia movediça...
Quando comecei a viajar pelo mundo fora, visitando paraísos exóticos como Armação de Pêra ou Badajoz, impunha-se o exercer da minha tendência para a recolecção.

E como sou um indivíduo extremamente criativo, sempre em busca de ideias "fora da caixa" (como eu adoro esta expressão), nada melhor do que começar a comprar AQUILO QUE TODA A GENTE COMPRA PARA ASSINALAR A PRESENÇA NUM LOCAL. O problema é que como já viajo há alguns anos e comecei a fazer aquilo logo na primeira viagem, agora não consigo parar. Penso que, de alguma forma, estou a faltar ao respeito ao pequeno Saguim que comprou o primeiro íman ou o primeiro copo... E se eu não gosto de faltar ao respeito a ninguém, muito menos a mim próprio!

O que é que eu faço com estas lindíssimas peças de decoração?
Os ímanes, pasmem-se, estão na porta do frigorífico. Se dúvidas houvessem que sou bimbo, basta darem um salto aqui à cozinha do menino. Os copinhos de shot que NUNCA foram, são ou serão usados, estão num armário a apanhar pó.

Agradeço a Deus que a minha mulher ainda não se lembrou de implicar com isto.
Porque se algum dia o fizer vou ter de pô-la na rua.

É que mulher tenho uma, ímanes e copinhos tenho muitos. Em termos de colecção, a segunda ganha em quantidade.


3.
CROMOS

Estes felizmente já não colecciono. É que, verdade seja dita, aquilo dava uma trabalheira dos diabos. Era o ritual de comprar carteirinhas nos quiosques, cujos donos esfregavam as mãos de contentes quando me viam aproximar arrastando um adulto cabisbaixo pela mão. É preciso dizer que, à minha conta houve muito antigo proprietário de quiosque que se deu bem na vida. O Belmiro de Azevedo, por exemplo, tinha o dele junto à Tarantela no largo da Estefânia. E hoje nem uma lembrança no Natal nem nada. Enfim, feitios.

Depois da compra das carteirinhas seguia-se o abrir das mesmas e a felicidade incontrolável quando se encontrava um ou dois que não se tinha. Os outros engrossavam o molho dos repetidos que se prendiam com um elástico. Depois ainda implicava arte e engenho na altura de colar aquilo dentro dos limites da moldura respectiva, no álbum. Apesar de fazer muita coisa mal na altura (hoje já não faço nada mal como é evidente) era um verdadeiro mestre na colagem perfeita e sem mácula de cromos em cadernetas. Agora, o que é que isso me rendeu na vida? Pouco.

Talvez por isso, porque não é por saber colar bem crominhos num quadrado que mais depressa arranjo emprego, que me deixei de coleccionar cromos. Claro que isso não invalida que tenha aqui duas ou três Simaras de cadernetas (num mundo ideal, "Simara" seria uma unidade de medida de peso) a fazer as delícias dos bichos do papel. Mas como temos de ser uns p'rós outros...


Bom, adiante...


TOP 3 DAS COLECÇÕES, COMPLETAMENTE ANORMAIS, BIZARRAS, ESTAPAFÚRDIAS E TUDO MAIS DE ESTRANHO E LYNCHEANO QUE LHE QUEIRAM CHAMAR, DO VOSSO SEMPRE AMIGO SAGUIM.


1.
POSTAIS ILUSTRADOS

Além de todos os adjectivos acima descritos, esta colecção introduz-nos também o campo do incrivelmente DEPRIMENTE.

Postais ilustrados.

Em que é que eu estava a pensar quando decidi juntar umas micas numa pastinha e guardar tudo o que se enquadrava neste universo? A menos que estivesse nesse preciso momento a ser operado ao cérebro, com uma serra a separar-me os hemisférios, julgo que não tenho desculpa alguma.

Sim, eles ainda aqui estão. Na pastinha.
Coisas tão díspares como aqueles postais com bonecos horrivelmente ordinários que se vendem no Algarve, o sempre terno Topo Gigio ou uma ilustrações foleiras de, por exemplo, o "Outono".

Nunca mostrei isto a ninguém. Ao menos aí tive juízo.
Não que a colecção seja repulsiva de alguma forma mas é mesmo MESMO muito nonsense. Não é fácil explicar às pessoas que aquele que se lembrou de iniciar tal colecção, ou seja eu em puto, não era também possuidor do QI de um rato morto. É uma cantiga difícil de engolir.


2.
PORTA-CHAVES

Apercebo-me que praticamente TODAS estas colecções foram iniciadas em criança e que eu hoje sou apenas a vítima de um horrível legado pelo meu "eu" passado... Fui claro? Basicamente gostava de voltar atrás no tempo, mandar um banano em mim próprio e berrar-me ao ouvido "PÁRA DE ACUMULAR M***A, PÁ!!!" Talvez tivesse resultado. Mas cheira-me que nunca vou ter a certeza.

Bom, os porta-chaves. Um flagelo da minha vida actual.
Quando era miúdo vi uma fantástica reportagem do Canal 1 (como lhe chamavam na altura) sobre uma tasca que tinha o tecto coberto de camarões (os parafusos, não o marisco) que penduravam uma épica colecção de porta-chaves. De todas as formas e feitios. E como os clientes da Casa de Pasto já sabiam que o dono tinha esta, digamos, deficiência, traziam-lhe sempre novos cada vez que lá iam comer. E o dono punha mais camarões e pendurava mais porta-chaves no tecto. E toda a gente achava graça. Apesar de estarem a almoçar na iminência de lhes cair um sapo Cocas no guisado.

Aquilo que hoje me repugna antes maravilhava. Achei muito boa ideia. E imaginei que seria muito lindo ter um dia o tecto da minha casa coberto de camarões e uma colecção de porta-chaves ainda maior do que aquela.

Camaradas, só para vos dar um lamiré... Vamos admitir que eu não tinha mudado nada e continuava a pensar da mesma forma. O dia em que eu abordasse esse assunto junto da minha mulher era o dia em que passaria a ser conhecido como "o Eunuco de Benfica"... E mais não digo.

Feitas as contas, tenho duas enormes caixas cheias de porta-chaves até acima e não sei o que fazer com elas. Cómico é o facto de que sempre que preciso de um porta-chaves vou comprar. Podia tirar um qualquer da caixa mas aqueles pertencem à colecção. Colecção essa que eu já não quero mas que também não vou deitar fora... Até porque muitos dos itens me foram oferecidos e vieram de outros pontos do globo terrestre. Dilema, dilema, dilema...

Há uns anos atrás apercebi-me finalmente daquele que seria um destino digno para esta colecção: a doação a um qualquer Museu do porta-chaves. Em troca de uma ala com o meu nome, claro.

Só que não há nenhum.
Parece que o Estado acha que porta-chaves e cultura não estão bem no mesmo patamar.
É por isso que o Estado é estúpido. Por isso e por mais nada.


E chegámos então àquela que é a "pièce de résistance" desta conversa toda. A colecção mais bizarra de todos os tempos, fora da prisão ou do hospital psiquiátrico.

Pede-se às pessoas mais sensíveis que fechem esta janela e abram outra com o Noddy, por exemplo. Pede-se aos bravos que decidirem ficar para desligarem o som dos telemóveis e afastarem-se de objectos cortantes. Obrigado.

Então cá vamos a isto.

3.
É MELHOR NEM PÔR TÍTULO

Quando era miúdo (outra vez!!!) passava muito tempo sozinho em casa dos meus avós. Os meus avós tinham e têm, felizmente, um terraço no último andar de um prédio. Eu passava muito tempo nesse terraço a falar sozinho e a olhar para as moscas.

As moscas pousavam no muro do terraço, a apanhar sol. Eu olhava para elas e achava que a nossa convivência podia ser levada para um outro nível. Algo mais íntimo.

Daí, comecei a olhá-las com um frasco de vidro na mão. A conceber todo um plano maquiavélico. Elas é que esfregavam as patinhas ao sol mas eu é que estava a congeminar algo terrível. Elas não faziam ideia. Eu sorria, com o frasco na mão.

Após várias tentativas capturei uma, colocando o recipiente de cabeça para baixo. Arrastei-o sem o afastar da base até ao limite do muro e coloquei a mão debaixo, a tapar.

Fui buscar álcool etílico.
Às escondidas porque, vá-se lá saber porquê, a minha avó gostava pouco que eu brincasse com álcool, ou com fósforos, ou menos ainda com as duas coisas ao mesmo tempo. Mas logo por azar era com isso que eu mais gostava de me entreter...

Coloquei um pouco de álcool no frasco. Deitei-lhe fogo. Labareda súbita. Mosca carbonizada no fundo do frasco.

Depois retirei a mosca e com o auxílio de uma velha faca, cortei-lhe a cabeça e coloquei-a num pratinho de esmalte que os meus avós tinham. Achei tanta graça à ideia que comecei a fazer disso o meu hobby de fim de tarde. E a dada altura a minha colecção de "cabecinhas de mosca num prato de esmalte" fazia já inveja a muito bom assassino em série!

...

(pausa para aplausos)

...

(outra pausa para constatar que não houveram aplausos)

...

Tenho a recordar que aquilo que hoje se acha horrendo na altura era uma forma de passar o tempo como outra qualquer. É importante não esquecer que só haviam dois canais de televisão e o Eládio Clímaco aparecia mais do que seria desejável.

Bom, mas a verdade é que eu próprio acho que aquilo não era coisa que se fizesse. Não sei onde foi parar essa minha colecção mas desconfio que a minha avó a tenha confundido com insectos mortos e a tenha deitado para o lixo. Onde pertencia, convenhamos.

De qualquer forma, e dentro desta minha veia de recolector é a única colecção verdadeiramente original. Aquela que não deve haver muito mais gente no mundo a ter uma igual. Eu pelo menos assim o espero.

Para terminar, Caçador ou Recolector? Qual o melhor, afinal?

Parece-me que acaba por ser o Caçador.
Mais limpinho, mais organizado, mais apelativo para as gajas e, acima de tudo...

... com menos cheiro a mosca morta impregnado na roupa.

Saturday, November 13, 2010

Do not cross

Já não é segredo para ninguém que a minha saída de Benfica está para muito breve.
Não é segredo porque eu mesmo o anunciei neste blogue há umas semanas, apesar de ninguém me ter perguntado nada.

Digamos que não sou muito bom a guardar segredos...

Basicamente tenho até ao final do mês para abandonar esta casa.
O meu lar doce lar durante os últimos dois anos e meio.
Casa essa que se pusermos de lado o chifrudo do vizinho anti-ruído, o escape negro do autocarro que pára à porta, os gritos dos transeuntes drogados e marginais de madrugada, o indivíduo meio monhé que está 24 horas por dia, 7 dias por semana, 12 meses por ano, sentado na esplanada da rua a beber imperiais umas atrás das outras sem ficar bêbado e a conversar com os velhotes, o ordinário que me riscou o carro, o outro ordinário que um dia me colocou um bilhetinho no limpa pára-brisas a chamar-me "anormal", os vizinhos mal-encarados, o indivíduo que vem receber a renda todos os dias 7, estilo medieval, porque, ainda não percebi porquê, não se pode pagar via multibanco, o violador de Telheiras que aterrorizou as redondezas, o mijo que muitas vezes aparece no hall de entrada do prédio e cujo mijão se nega a limpá-lo e o intercomunicador que o senhorio se orgulha em pura e simplesmente não mandar arranjar... se pusermos de lado tudo isso, esta casa nem nos acolheu muito mal.

A verdade é que aquela para onde vamos fica bem longe daqui e precisa de umas obras antes da mudança. Nada de fundo, não comprei nenhuma barraca, embora tenha visto algumas bem jeitosas e em conta, mas é coisa para durar uns dois mesinhos. Por causa disso, os últimos tempos não têm sido nada fáceis porque pensar em tudo o que queremos fazer e ainda tratar de mil e uma burocracias e chatices acaba por ser quase outro trabalho a tempo inteiro. E se já me chateia ter um, então dois é mesmo coisa para dar cabo dos nervos.

O problema é que quando não sobra tempo para mais nada, há uma série de outras coisas extra-emprego que ficam ou em stand-by ou quase completamente esquecidas. Falo de algo tão essencialmente simples como a limpeza da casa onde ainda estou. Ou da ausência dela.

Por um lado, sejamos sinceros, a permanência aqui neste momento provoca-me muito nojo.
Por outro, custa-me estar a gastar energia e recursos na higiene de um local que muito brevemente vai deixar de me albergar. Estão a ver o dilema?

Como sou preguiçoso acabo por me concentrar mais no segundo ponto. Aquele que diz: "What's the point...", afasta o lixo e se deita em posição fetal para acordar no dia seguinte de manhã. Sou preguiçoso para me mexer e fazer limpezas e, mais do que isso, sou preguiçoso para berrar à minha mulher que tem duas horas para pôr isto num brinquinho. Bom, aí sou até mais medroso porque penso que não me safava de levar uma patada nos dentes. Portanto, deixo-me estar.

Neste momento, é possível encontrar por aqui coisas curiosas e dignas da atenção da ciência.
As bolas de cotão atingem dimensões impressionantes e é comum vê-las a voar no corredor como se estivesse no Velho Oeste. Faz um bonito efeito. Fica só a faltar o Clint Eastwood mas não há meio do homem vir a Benfica. Coisa que eu até compreendo, dada a falta de fascínio e/ou interesse desta zona, mas a vir juntava-se o útil ao agradável e às tantas até me dava uma mãozinha e aspirava uma divisão ou outra. Assim de repente, parece-me pouco provável que um dia o Clint Eastwood me venha aspirar a casa por isso prefiro não contar com isso.

Sigamos em frente...

Esta casa produz bolas de cotão como a China produz leite em pó à base de veneno... É às pazadas. O que até se percebe dado que cá vivem 3 criaturas cuja principal função é gerar pêlo dia e noite. Falo da coelha, da gata e, como é evidente, da minha "mais que tudo". Eu sou apenas uma infeliz vítima desta situação horrível dado que pouco pêlo possuo já na zona da cabeça, e o pouco que tenho é regularmente rapado. Já sugeri o mesmo "hairstyle" às referidas 3 criaturas mas a sugestão foi recebida com pouco entusiasmo. Resultado disso é a continuidade das tais bolas de cotão.

Mas agora são tantas e tão grandes que a gata volta e meia olha para mim com os olhos arregalados como quem diz: "Ehpá, já limpavas isto ó porco da m***a! Tenho conhecidos que vivem às espinhas na rua e nem eles se sujeitavam a este pardieiro." Vai daí, dou-lhe um biscoito e compro-lhe o silêncio por mais algumas horas. Ah! E volta e meia também é costume ouvi-la espirrar muito atrapalhada quando decide engolir um pedaço de cotão. Sempre uma graça. Eu sorrio perante a sua estupidez, dou-lhe uma festa na cabeça e fico a desejar que tão cedo uma não se cruze no seu caminho. Por agora, é tudo o que consigo fazer.

Mas se o cotão é realmente um enorme flagelo, o que dizer das descobertas revolucionárias que se vão passando na cozinha? Sim, é verdade, coisas do arco da velha. Já alguma vez tiveram uma abóbora podre no caixote do lixo durante dias? Não é tão espectacular como dizem. Na verdade, é tão nojento que se torna quase ofensivo. Eu levei a reacção da abóbora perante o tempo e a exposição ao ar como um insulto pessoal.

Primeiro a velhaca decidiu dizer-me que não estava em condições de ser consumida através do seu aspecto. Tinha ar de estar estragada e assim sendo foi devidamente colocada no caixote. O problema é que, dada a tal falta de tempo, esse saco acabou por permanecer no lixo durante alguns dias. O suficiente para a porra da abóbora me encher o caixote de uma espécie de água infernal emanadora de cheiro nauseabundo. Uma cortesia desta besta.

Eu nunca fui grande fã de abóboras e de um certo ponto de vista alguma razão deve ter a malta que lhes desenha caras feias e as exibe no Dia das Bruxas. Mas daí ao ódio que senti naquele dia vai uma boa diferença... E tão cedo parece-me que não ponho nenhuma na sopa!

Na cozinha sucedeu ainda outro fenómeno natural digno de nota. Depois de uma refeição de favas com chouriço e de colocado o excedente num tupperware, o meu genial cérebro sugeriu-me que colocasse o recipiente dentro do forno por estar ainda quente, a fazer horas para ir para o frigorífico. Dentro do forno, porque em cima da bancada está fora de questão. A menos que queira proporcionar à gata o banquete do ano, o que muito sinceramente não me seduz por aí além. Coloquei então o tupperware dentro do forno e o mesmo só foi reencontrado alguns dias mais tarde.

O cheiro era deveras incomodativo, verdade.
Impregnava a cozinha como o cadáver de uma doninha, verdade.
Mas o novo aspecto peludo e fofinho atribuía à velha refeição uma faceta carinhosa. Muito terna. Como um peluche mas para comer...

Enfim, digno de estudo digo-vos eu. Mas como também não tenho tempo para isso deixei a biodiversidade em "águas de bacalhau".

De qualquer maneira, há mais a dizer acerca deste upgrade de pocilga ao qual ainda chamo casa. A casa de banho, por exemplo, nem está muito mal.

Para uma casa de banho pública.

Se considerarmos os critérios dos sanitários dos centros de dia ou das estações de comboios, esta até dá gosto.

Ou então não e é repugnante como as outras... Mas não vou entrar em pormenores para não chocar ninguém e não provocar aquele movimento do esófago que "diz que vomita e depois não vomita". Enfim, isto por aqui está agreste.

O volume de roupa suja excede agora em muito o volume de roupa limpa. Não há tempo para meter na máquina e, além do mais, tem estado de chuva. Portanto, tenho agora um cesto a transbordar e ainda um saco cheio em cima, a fazer peso para que a tampa feche minimamente, que não me deixa mentir. E escusado será dizer que estes dois elementos acentuam ainda mais o clima de "barracaria" que domina este domicílio. É de fugir.

Aliás, hoje calcei o último par de peúgas da gaveta. Umas brancas da nike, para jogar à bola. Em situações normais não as usaria hoje mas não me restou outra opção. As cuecas também estão a acabar-se e se não tratar da roupa o quanto antes parece-me que vou ter de optar por um estilo de vida mais "à larga". Espero do fundo do coração que não chegue a tanto.

Feito um balanço final, aquilo que me dá algum alento é que TODA esta situação não é senão temporária. Daqui a pouco tempo já estarei numa casa mais bonita, com mais luz, mais arrumos, mais espaço... e mais área para distribuir a porcaria que mais tarde ou mais cedo se gera! Dar-me-á muita alegria.

E mesmo que tenha de lidar com isto por agora, convém manter o bom humor.

Sorrir sempre.

Não desesperar com a falta de tempo.

Ser optimista e, sobretudo...

... comprar mais biscoitos para gato.