Tuesday, February 17, 2009

O futebol depois de Bynia

Para quem não sabe, o Benfica não só é o maior clube do mundo como também tem um papel fulcral no desenvolvimento do próprio futebol. E do desporto em geral. E consequentemente da produção de cerveja. E da continuidade do mundo tal como o conhecemos.

Para quem não sabe e para quem me manda calar sempre que desenvolvo esta minha teoria. Sem Benfica, meus caros amigos quer queiram quer não, a coisa não andava para a frente.

Um exemplo concreto? Então vamos lá a isso: BYNIA.

O Bynia é um sujeito que veio trabalhar para o Benfica há mais ou menos dois anos. Eu digo sujeito porque a palavra jogador às tantas é demasiado forte para designar a sua actividade. Mas isso não faz com que o Bynia seja menos importante para o Benfica e para o futebol moderno. A sua naturalidade é indefinida. Da testa para cima: escandinavo. Da testa para baixo: camaronês. Acho que optou pela segunda. Mas até aqui tudo bem. É dentro do campo que o rapaz faz toda a diferença. A verdade é que o Bynia reiventou todo um conceito de futebol, coisa passível de figurar num livro de filosofia, e se ele não se põe a pau ainda sou eu que o escrevo e fico com a honra e glória. Agora perguntam-me vocês: "- Mas, ó André, sendo que os Camarões não têm nenhuma escola filosófica propriamente dita, como é que este artista consegue revolucionar o que quer que seja?". Perguntam-me vocês e, se me permitem, estupidamente. Vou procurar explicar com um exemplo concreto da minha própria vida:

Eu gosto muito de ver e jogar futebol. Claro que, hoje em dia, das raras vezes que jogo, a minha participação é muito semelhante àquela que a pedreira do Estádio do Braga tem nos jogos dos minhotos. Talvez esta seja até um pouco mais activa mas também é natural porque participa em metade dos jogos da época. Quando era miúdo pesava o mesmo que peso agora. Se eu hoje sou, digamos, gordo, então imaginem o que se passava quando tinha metade da altura. Volta e meia apareciam senhores de fato macaco na rua que me regavam com grandes mangueiras, convencidos de que eu era alguma espécie de elefante marinho e não podia estar assim "ao ar". Nesses tempos, também eu quis ser jogador de futebol mas, para além do meu notório handicap físico, não tinha lá muito jeito. E isto do jeito não tem nada de subjectivo: as bolas que deviam ir ter à baliza iam vários metros ao lado ou por cima, os passes que deviam ir ter aos meus colegas iam invariavelmente dizer "olá" aos adversários e as fintas acabavam sempre comigo espetado no chão. Sempre. Ora, houve tempos em que também eu acalentei o sonho de vir a ser jogador profissional de futebol. Mas bastaram dez segundos de lucidez para perceber que isso nunca aconteceria, e ainda bem. Por alguma razão as pessoas ainda ligam a televisão para ver "bom futebol". Porque o conceito de "bom futebol", aquele que, bem ou mal jogado, de alguma maneira procura fazer sentido, faz com que os jogadores se esforcem para conseguir o mesmo: acertar as posições, acertar os passes e fazer com que a coisa esférica entre no espaço delimitado por redes, lá do outro lado do campo. Em suma, eu abdiquei de uma carreira desportiva em prol da lógica das coisas. E durante anos vivi orgulhoso da minha decisão.

Mas um dia apareceu o Bynia.

Meus amigos, o Bynia provou que o futebol é o que um homem quiser. Aquilo que ele faz não é jogar à bola, é um manifesto pelo direito a jogar no Benfica. Ele passa mal as bolas aos companheiros? Eu acho que nem se preocupa em fazê-lo bem, isso são preocupações menores. Ele remata à baliza contrária com intuito de marcar golos? Nem por sombras, o objectivo é fazer com que a bola se vá enterrar pela cúpula do Colombo a dentro. Ele finta, desmarca ou cumpre abnegadamente a sua posição do terreno? Nunca! Para quê, se abalroar adversários é muito mais divertido?! É vê-los a saltar como coelhos, de cada vez que o Bynia alça a perna acima do pescoço. Um fartote.
Agora, com todas estas particularidades seria de prever que os treinadores do Benfica não só não o utilizassem como o proibissem de chegar a menos de 500 metros do Estádio da Luz. Mas ele mantém-se no plantel. Volta e meia é titular, muitas vezes até relegando colegas bem "melhores" para o banco de suplentes. E continua a merecer toda a confiança do mundo.

E à custa disso, assim evolui o futebol. Desporto esse que, se houvesse justiça, passaria a ter duas eras: AB (antes de Bynia) e DB (depois de Bynia).