Tuesday, April 8, 2008

Ser Benfiquista

Porque é que eu sou do Benfica? É a pergunta que já coloquei a mim próprio muitas vezes e à qual nunca obtive uma resposta convincente. No fundo, não consigo justificar-me perante o meu próprio bom senso e isso, parecendo que não, explica muita coisa. Sou do Benfica porque parte do meu cérebro não funciona em termos. Deve ser isso.

Mas será que alegar insanidade é o suficiente para conseguir escapulir-me a uma análise mais profunda? E porque não? Resulta em muitos julgamentos. Muito bom assassino vai parar a um quartinho almofadado para não acabar numa cadeirinha almofadada por fofinhos eléctrodos letais. Então se é assim, porque é que não posso dizer “- Sou maluco e pronto!” e ficamos por aí?!

Talvez porque seja um pouco mais exigente... Talvez por isso, vou então desconstruir a minha existência de modo a conseguir fundamentar a minha preferência clubística. À boa maneira de Gollum, esquizofrénica personagem das histórias de J.R.R. Tolkien, vou encetar um confuso e perturbado diálogo entre o meu hemisfério cerebelar esquerdo (aquele que tem juízo) e o meu hemisfério cerebelar direito (aquele que tem defeito e é 100% benfiquista). Ora aqui vai...


(hemisfério esquerdo) - Olha lá, o Benfica provoca-te desespero?
(hemisfério direito) - Sim, há anos e anos, de diversas formas e feitios. Já chorei, berrei, bati em mim próprio e nos outros, sempre a chorar e a berrar, por causa das derrotas do Glorioso.
(hemisfério esquerdo) - Estou a ver... Então e alegrias? O Benfica faz-te feliz?
(hemisfério direito) - Epá, esporadicamente...
(hemisfério esquerdo) - Com que frequência?
(hemisfério direito) - Nunca (suspiro)...
(hemisfério esquerdo) - Bem me parecia. Explica-me então porquê? Porque raio és benfiquista?
(hemisfério direito) - Ok. Vou contar-te então uma história...


CONTO DE UMA TARDE DE CHUVA (tentativa desesperada do meu hemisfério cerebelar direito, aquele que tem um parafuso queimado, para tentar convencer o meu hemisfério cerebelar esquerdo, aquele que é são como a Fátima Lopes que ingere Activia e nunca sofre de prisão na tripa, de que ser do Benfica é realmente boa ideia e coisa para continuar até ao fim dos dias do André, a embalagem dos dois hemisférios que se encontra a babar-se abundantemente enquanto estes se envolvem num bizarro diálogo)

Isto passou-se há cerca de uma hora atrás, numa zona de Lisboa onde desenvolvo a minha actividade profissional (aos meus colegas que neste momento estão rebolar-se no chão, a rir às gargalhadas, enquanto exclamam “- Profissional?! Este babuíno amestrado nem à chapada conseguia ser amador, quanto mais...”, a todos eles um violento manguito na tromba). Ia eu a caminho de um café, a passar por um terreno cheio de carros estacionados quando avisto uma estranha silhueta vermelha a efectuar aquilo a que ele apelidava de “dança” mas que me parecia ser os espasmos de um flamingo com epilepsia. Era um simpático e bonacheirão arrumador de carros, vestido à Benfica dos pés à cabeça, e encontrava-se a bailar porque estava feliz... ou bebâdo... ou então um misto dos dois. Eu sorri para ele e disse para mim próprio “- Seria mais construtivo se esta besta fosse antes bulir para as obras e acartasse cimento em vez de acartar pacotes de vinho...”, e depois prossegui. Ele, protegido pelo glorioso símbolo da águia e por um farfalhudo bigode preto, riu-se para mim e exclamou-me qualquer coisa que não percebi porque a sua boca ostentava apenas dois apodrecidos dentes nas gengivas. Eu ri também, para não ser mal educado, dei-lhe uma pancada amigável nas costas e segui o meu caminho. Quando abandonava o local de lazer, o “bailarino” chamou-me de longe e veio a ziguezaguear até mim pelo meio dos carros. Pediu-me um isqueiro e avisou-me desde logo que estava metido na droga e no vinho até à ponta dos cabelos. Eu fiz um ar surpreendido, como se os meus sentidos todos já não tivessem dado conta do fedor, e pedi-lhe que tivesse cuidado com a saúde. Disse isto com a perfeita noção de que a saúde e este menino com certeza nunca sequer se encontraram. Ele ria como louco e efectuava notável malabarismo com os seus dois dentes, sempre envergando com orgulho o resplandescente fato-de-treino do Benfica. Entretanto, no meio do discurso incoerente, lá deixava escapar: “- Você ainda me vai dar cinquenta cêntimos...”. Eu olhei para aquela infeliz criatura desdentada e dei-lhe um euro, tentando impedir que voltasse a efectuar a sua “dança” diante de mim. Ele ficou todo contente com a preciosa ajuda para novo serão de festarola. Eu voltei à minha vida, impressionado com o espectáculo.

Ora, o sujeito era drogado? Era. O sujeito era bêbado? Era. O sujeito tinha um aspecto tão repugnante que se adormecesse numa praia faria com que o Greenpeace processasse o Governo? Tinha.

Então porque bailava ele? Porque ria ele? Porque é que procurava ensinar-me coisas enquanto me bufava perdigotos pestilentos para os olhos?
Porque era do Benfica. E era feliz!


O FIM



Isto é para o meu hemisfério esquerdo aprender a ficar calado! VIVA O BENFICA!

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